quinta-feira, fevereiro 10, 2005

Venda da Alma e Venda do Corpo

Não só as mulheres que casam sem amor, mas apenas por conveniência;
não só as esposas que continuam a comer o pão daquele que já não amam e enganam;
não só as mulheres se prostituem.
É prostituto o escritor que coloca a pena ao serviço das ideias em que não crê;
o advogado que defende causas que reconhece injustas;
quem finge a adesão aos mitos e interesses dos poderosos para obter recompensas materiais e morais;
o actor e o bobo que se expõem diante dos idiotas pagantes para arrecadar aplausos e dinheiro;
o poeta que abre aos estranhos os segredos da sua alma, amores e melancolias, para obter em compensação um pouco de fama, de dinheiro ou de compaixão;
e, acima de tudo, é prostituto o político, o demagogo, o tribuno que todos devem acariciar, seduzir, a todos promete favores e felicidade e a todos se entrega por amor à popularidade - justamente chamado homem público, quase irmão de toda a mulher pública.
Mas quem de entre nós, pelo menos um dia da sua vida, não simulou um sentimento que não tinha e um entusiasmo que não sentia e repetiu uma opinião falsa para obter compensações, cumplicidades, sorrisos ou benefícios?
Quem dá uma parte de si por vantagens pessoais prostitui-se como a mulher que atribui um preço à sua docilidade.
Mas a prostituição da alma praticada pelos homens é mais ignominiosa do que a do corpo, e mais irremissível.

Giovanni Papini, in 'Relatório Sobre os Homens'